nov, 26 2024
A Procuradoria Parlamentar da Câmara dos Deputados do Brasil recentemente se posicionou de forma contundente contra a investigação movida contra o deputado Marcel van Hattem. Em seu relatório, a Procuradoria destacou a importância de proteger as manifestações dos parlamentares, algo que está assegurado pelo Artigo 53 da Constituição Federal. Este dispositivo garante inviolabilidade aos deputados e senadores por quaisquer opiniões, palavras e votos que proferirem no exercício de seus mandatos. Segundo a Procuradoria, investigar encarapaçamentos feitos do púlpito parlamentar poderia ecoar um perigoso precedente de autocensura – onde os parlamentares, com medo de retaliação, evitariam expressar suas visões de forma plena e desimpedida.
O caso que alimenta esta controvérsia teve início em agosto de 2024, quando van Hattem proferiu críticas duras ao delegado da Polícia Federal, Fábio Alvarez Schor, durante uma das sessões legislativas. Na ocasião, van Hattem acusou Schor de fabricar dossiês fraudulentos com o intuito de justificar a prisão de Filipe Martins, ex-assessor do ex-presidente Jair Bolsonaro, algo que o deputado considerou totalmente sem fundamento. A detenção de Martins ocorreu durante a operação Tempus Veritatis, que investigava uma suposta tentativa de golpe durante o governo Bolsonaro. Essa operação gerou grande burburinho, principalmente após Martins ser solto alguns meses depois, em agosto de 2024, por ordem do próprio Ministro Alexandre de Moraes.
Vários defensores da liberdade de expressão, incluindo o próprio van Hattem, argumentam que as falas do deputado fazem parte de uma crítica política legítima, algo central para o funcionamento saudável de qualquer democracia. Eles reiteram que a imunidade parlamentar não é um privilégio individual dos parlamentares, mas sim uma garantia de que o debate político ocorra sem restrições indevidas. Contudo, a Polícia Federal discordou dessa interpretação e, em novembro de 2024, indiciou van Hattem por calúnia e difamação, alegando que suas declarações tinham como objetivo constranger, humilhar e ofender o delegado Schor. Em seu parecer justificando a investigação, a PF também incluiu citações de Eduardo Bolsonaro, mesmo que estas não tenham sido realizadas por van Hattem, criando ainda mais polêmica.
O debate sobre qual deve ser o alcance da imunidade parlamentar ganhou ainda mais força quando figuras políticas proeminentes, como o ex-presidente Jair Bolsonaro, classificaram a investigação como um "ataque ao Parlamento brasileiro". Bolsonaro invocou novamente o Artigo 53, suplicando a importância de resguardar nossos parlamentares de eventuais abusos. Neste ponto, é útil reconhecer que o papel do Supremo Tribunal Federal muitas vezes entra em cena para dirimir dúvidas e determinar até onde essas imunidades se estendem. Até que ponto a crítica política configura um abuso ou ofensa continua sendo uma linha tênue que gera embates frequentes entre os Poderes da República, principalmente em temas que envolvem figuras públicas de alto calibre.
Com o avanço do caso, o que fica claro é que esta não é meramente uma questão jurídica, mas também política e de valores democráticos. As decisões que serão tomadas a respeito deste indiciamento poderão lançar longas sombras sobre como o Legislativo brasileiro se auto-regula e qual o grau de liberdade seus membros realmente desfrutam ao pronunciarem-se sobre questões de interesse público.
Embora as consequências deste caso ainda estejam por se desdobrar completamente, as implicações são potencialmente transformadoras para o ambiente político brasileiro. Existe uma preocupação crescente de que o andamento desta situação possa resultar numa 'caça às bruxas' parlamentar, onde políticos serão desencorajados a falar abertamente por medo de retribuições legais. Esta perspectiva de um Legislativo embaraçado tem grande potencial de restringir o vigor com que questões cruciais são debatidas, isolando ainda mais a população das decisões políticas que afetam suas vidas.
A vigilância da sociedade civil e das entidades de advocacia pela liberdade de expressão será crucial nos próximos meses para assegurar que as garantias constitucionais sejam respeitadas. Resta igualmente importante que o diálogo entre os Poderes prossiga de modo construtivo, com a intenção de repactuar um entendimento claro do papel das imunidades parlamentares e dos limites razoáveis da crítica política. Somente assim será possível fortificar, e não fragilizar, a ordem democrática estabelecida.
Em uma conjuntura tão fervilhante quanto esta, é crucial que todos os cidadãos brasileiros se mantenham informados e que participem ativamente da discussão pública. Afinal, a liberdade de falar no Congresso é, em última instância, um reflexo da liberdade de expressão que deve ser protegida por qualquer democracia que valorize seus princípios fundamentais.