Em 21 de junho de 1970, às 16h00, no Estádio Azteca, na Cidade do México, o futebol mudou para sempre. A Seleção Brasileira não apenas venceu a Itália por 4 a 1 — foi um espetáculo. Pelé, com um toque de calcanhar que parece saído de um sonho, abriu o placar. Gérson, com a precisão de um cirurgião, ampliou. Jairzinho, o Furacão da Copa, marcou seu sétimo gol no torneio. E Carlos Alberto Torres, capitão, fechou com um gol coletivo que ainda é exibido em escolas de futebol. Nada menos que o primeiro tricampeonato da história. E com ele, a Taça Jules Rimet, para sempre brasileira.
Antes da final, ninguém duvidava. Mas nem todos acreditavam que seria tão dominante. A Seleção Brasileira entrou em campo em 3 de junho de 1970, no Estádio Jalisco, em Guadalajara, e goleou a Tchecoslováquia por 4 a 1. Rivellino, Pelé e Jairzinho (duas vezes) deixaram claro: não era só talento, era método. Contra a Romênia, em 10 de junho, outra vitória por 3 a 2. Pelé fez dois gols em 30 segundos — algo que ainda hoje causa arrepios. O técnico Mário Jorge Lobo Zagallo, bicampeão como jogador em 1958 e 1962, montou um time que não tinha fraquezas. Seis jogos. Seis vitórias. Nenhuma derrota. Nenhum empate. Um recorde que só foi igualado, nunca superado, em Copas do Mundo.
Jairzinho, com sete gols, foi o primeiro jogador a marcar em todos os seis jogos de uma mesma Copa. Um feito tão raro que, 54 anos depois, ninguém chegou perto. Pelé? Ele não só marcou — criou. Seis assistências. Um título. A única pessoa da história a levantar a Taça três vezes. E não foi só o número. Foi a forma. A bola parecia grudar no pé dele. As defesas italianas, que haviam contido Pelé em 1966, não tinham resposta. O que fez a diferença? A liberdade. Rivellino cortava pela esquerda, Gérson comandava o meio, Carlos Alberto liderava com inteligência. E Tostão, mesmo com um olho machucado, enxergava jogadas que os outros não viam. A escalação? Félix, Carlos Alberto, Wilson, Piazza, Everaldo, Clodoaldo, Gérson, Rivellino, Jairzinho, Pelé, Tostão. Um time de sonho.
Ao apito final, o Estádio Azteca — com mais de 100 mil pessoas — entrou em colapso. Torcedores mexicanos, que antes torciam pela Itália, agora corriam atrás de camisas, meias, até o chapéu que Pelé usava. O Rei ficou só de cueca, com um sombrero na cabeça, sendo carregado por desconhecidos. Foi um momento de pura emoção. Não era só futebol. Era cultura. Era identidade. Naquela noite, o México e o Brasil se abraçaram. O jornal Hora registrou: "Ninguém pensava em política. Só em beleza." E era verdade. Em plena ditadura militar, o Brasil encontrou um alívio coletivo. Um momento em que o país inteiro, de norte a sul, parou para respirar juntos.
Em 2020, no 50º aniversário do título, o técnico Adenor Leonardo Bacchi (Tite) disse algo que ecoou por todo o mundo: "A Seleção das Seleções, bem simples assim." Não foi exagero. A equipe de 1970 não era só a melhor da época. Era a que melhor representou o que o futebol pode ser: arte, coragem, criatividade. Enquanto a Inglaterra de 1966 jogava com pragmatismo, o Brasil mostrou que vencer e encantar são a mesma coisa. A Taça Jules Rimet, que até então era disputada em rodízio, foi entregue definitivamente ao Brasil — e nunca mais foi recriada. O formato mudou. Mas o legado? Permanece.
Depois de 1970, o Brasil conquistou mais dois títulos — em 1994 e 2002 —, totalizando cinco. Mas nenhum deles teve o mesmo impacto. Em 1994, era um time de eficiência, com Romário e Bebeto. Em 2002, foi uma máquina de guerra com Ronaldo. Em 1970, era poesia. Era um time que jogava como se não houvesse amanhã. E foi isso que o mundo viu: um país que, mesmo sob repressão, soube mostrar ao mundo que a liberdade pode vir em forma de chute, de drible, de um passe de Pelé. Ainda hoje, quando crianças no Rio, em São Paulo ou em Recife tentam copiar o movimento de Carlos Alberto na final, elas não estão só brincando. Estão se conectando a algo maior. A um tempo em que o futebol não era só esporte. Era esperança.
A FIFA decidiu que a primeira seleção a conquistar três títulos mundiais (1958, 1962 e 1970) ganharia a Taça Jules Rimet para sempre. O Brasil foi o primeiro a alcançar esse feito, em 1970, e por isso a taça foi entregue definitivamente à CBF. A taça original foi roubada em 1983 e nunca recuperada, mas o direito de posse permaneceu com o Brasil.
Jairzinho, ponta-direita da Seleção Brasileira de 1970, marcou em cada um dos seis jogos da campanha, totalizando sete gols. Esse recorde ainda não foi superado. Nenhum outro jogador, antes ou depois, conseguiu marcar em todos os jogos de uma única edição da Copa do Mundo — algo que torna sua atuação ainda mais impressionante.
Em um período de censura e repressão, a vitória de 1970 serviu como um momento de unidade nacional raro. O governo usou a conquista para promover uma imagem positiva, mas o povo se apropriou do título como símbolo de liberdade e identidade. O futebol se tornou um refúgio, e a Seleção, um símbolo de resistência cultural. Milhões de brasileiros, mesmo os críticos ao regime, vibraram juntos — algo que a política não conseguiu fazer.
Pelé é o único jogador da história a levantar a Taça da Copa do Mundo três vezes — em 1958, 1962 e 1970. Embora outros tenham conquistado dois títulos, nenhum conseguiu o terceiro. Além disso, ele foi o único a marcar em duas finais (1958 e 1970) e a registrar seis assistências em uma única Copa, um recorde que ainda permanece. Sua trajetória é única, e seu impacto vai além do número de gols.
Enquanto a Inglaterra e a Alemanha priorizavam disciplina tática e físico, o Brasil apostou em criatividade, velocidade e jogo coletivo. Rivellino, Gérson e Carlos Alberto moviam a bola com precisão e ousadia. O futebol não era só para vencer — era para encantar. Essa combinação de técnica, ritmo e emoção ficou conhecida como "futebol arte" e influenciou gerações. Hoje, até times europeus tentam imitar esse estilo.
Zagallo é o único homem da história a ser campeão mundial como jogador e como técnico. Em 1958 e 1962, jogou e venceu. Em 1970, treinou a equipe perfeita. Ele soube equilibrar talentos individuais com coletividade, mantendo a identidade brasileira sem abrir mão da organização. Sua liderança foi silenciosa, mas decisiva — e ainda hoje é estudado por treinadores de todo o mundo.